O designer chefe de Cyberpunk 2077, Łukasz Szczepankowski, sugeriu que alguns jornalistas querem dar ao CD Projekt Red (CDPR) uma imagem de estúdio malvado em nome de uma narrativa ideológica quando publicam histórias sobre exploração da equipe de desenvolvimento através de horas extras obrigatórias.

Durante seu longo desenvolvimento, Cyberpunk 2077 foi acusado por jornalistas de transfóbico e racista, o que resultou pelo menos na opção de um protagonista não-binário. Mas na semana passada, o jornalista Jason Schreier, da Bloomberg, publicou um artigo no qual “revela” que a CDPR teria obrigado seus funcionários a entrarem em uma maratona trabalho fora do expediente habitual a fim de corrigir o maior número possível de problemas do jogo antes do lançamento em novembro.

A prática, chamada “crunch” em inglês, vem sendo condenada pela mídia americana e é inclusive tema de um livro escrito por Schreier, que em sua carreira militou sempre que pode a favor de pautas consideradas progressistas ou de esquerda.

Pelo Facebook, Adrian Chmielarz, fundador dos estúdios People Can Fly e The Astronauts, publicou um longo texto em polonês, que acabou sendo respondido por seus conterrâneos da CDPR. Abordando o tópico do “crunch”, Chmielarz explicou que o assunto não é “preto no branco” e o problema é inerente ao processo criativo, por melhores que sejam os gerentes de projeto e suas intenções.

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“O crunch é um fenômeno complicado e absolutamente nada preto no branco. Não posso dar um exemplo melhor do que o fato de que conheço pessoas do CDPR que fazem horas extras, saem e falam sobre a empresa coisas que fazem o cabelo arrepiar, mas também aqueles que trabalham ainda mais, mas ainda trabalham nela muito satisfeitos e não pretendem parar”.

“Ativistas caseiros e corações feridos têm uma resposta simples: os vampiros capitalistas sob coerção econômica espremem o espírito dos trabalhadores que trabalham duro, tratando-os como engrenagens facilmente intercambiáveis. E, de alguma forma, ninguém se pergunta como isso pode valer a pena quando dez outras empresas competem por cada programador ou designer gráfico razoável e quando cada arranhão na imagem da empresa causa problemas que podem ser traduzidos para a caixa registradora”, escreveu Chmielarz.

Para o fundador do People Can Fly, o problema vem da natureza do trabalho criativo e começa pelos erros humanos. “A incompetência amplamente compreendida se aplica a todas as pessoas e todas as profissões (“você pode se encaixar”), então não há razão para acreditar que não se aplique a gerentes de gerenciamento ou de projeto”.

“O que não é óbvio, e deveria ser, é que os trabalhadores também são incompetentes. Por alguma razão, pensamos que gerentes e chefes vão bagunçar o máximo possível, mas todos os funcionários nunca fazem pausas para fumar, não navegam no Reddit ou no Facebook, não fofocam por meia hora sobre a bunda de Marynia e sempre cumprem seus próprios prazos”.

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“Alguém consciente dirá neste ponto que está tudo bem, mas é função dos gerentes de projeto levar em consideração tudo o que foi dito acima e planejar de acordo, mas para mim é hipocrisia”.

Chmielarz então citou o fato dos jogos e o processo criativo exigirem mudanças e experimentos constantes, algo que é difícil prever até quando irá. “Quantas vezes você corrigiu sua própria postagem no Facebook, seu próprio tweet ou e-mail? Às vezes nem um pouco e às vezes provavelmente tudo”.

“A terceira razão é que trabalhamos no ramo de inovação. Apesar do fato de que a indústria existe há várias décadas, estamos constantemente introduzindo algo novo. Mesmo quando lançamos uma sequência do jogo, os jogadores não vão perdoar se for o mesmo, mas em uma pele diferente”.

O produtor então brincou com a exigência cada vez mais alta do público: “A razão número quatro é que os jogadores querem mais e mais por cada vez menos. Avaliações como ‘dei uma nota menor porque depois das primeiras 200 horas não há nada para fazer’ não são um meme, mas a realidade. Boa sorte para quem lança um jogo para um jogador de 8 horas e de uso único por US$ 60, como era comum há 10-15 anos”.

“O tempo médio para completar o primeiro e lendário God of War é de 9 horas. Alguém imagina seriamente que isso passaria nos dias de hoje?””

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Szczepankowski, designer de Cyberpunk 2077, ecoou os sentimentos de seu colega e provocou aqueles que atacam o estúdio escrevendo:

“Só posso confirmar o que Adrian Chmielarz escreveu. Mesmo que se trate das situações que ele descreve, minha experiência mostra que os desenvolvedores de jogos têm relativa solidariedade a esse respeito de cima para baixo, independentemente da posição tomada. Vamos desapontá-lo. Os gerentes de desenvolvimento de jogos não são os proverbiais capitalistas exploradores que contam dinheiro enquanto fumam um charuto e de vez em quando olham para os desenvolvedores oprimidos (por mais pitoresca que essa visão pareça)”.

Ele então lembrou que Adam Badowski, chefe da CDPR, respondeu à reportagem recente informando que a empresa mais uma vez dividirá 10% de seus lucros anuais com a equipe de desenvolvimento e isso não é uma forma de compensar o “crunch”, mas uma prática adotada pela CDPR espontaneamente.

“A CDPR divide os lucros por muito tempo, dentro do prazo e sem desculpas. Talvez tenha sido o riso em meio às lágrimas. Sério, tenho a impressão de que algumas pessoas preferiam que a gente fosse mau só para ter um fundamento para sua narrativa ideológica”, conclui ele.

Cyberpunk 2077, da polonesa CD Projekt Red, sai em 19 de novembro.